19 outubro, 2014

Droga de um noctívago apaixonado

Pergunto-me quantas mais noites quererás de mim. 
Pergunto-me o que farás com cada um delas e o que fazes com as que já me roubaste. O que fazes com o que me tiras quando estás comigo? Guardas em ti? 
Que tudo o que reténs das nossas madrugadas seja para consumo próprio. Que tudo o que te dou te drogue e te tire a incapacidade de vacilar por amor. Te dê a capacidade de vacilar por mais amor. 
Que te continue a trazer a vontade de dizer que estás aqui à porta. Mas, sobretudo, que te traga saudades quando não o puderes fazer mais (chegará o dia em que virás e eu já não estarei).
Entende que não quero nada de volta. Quero apenas saber onde me tens. Onde nos tens. 

Diz-me. Com um coração tão pequeno, onde é que guardas já metade da minha vida?



07 janeiro, 2014

Uma questão de ciclo

Sólido, líquido e gasoso. Três estados que aprendemos a identificar desde pequenos sobretudo na água que de acordo com a ciência, é a única substância que existe em simultâneo nas três formas.

Mas alguém já pensou no amor?
  
Para os menos entendidos nas questões da natureza, uma substância no estado líquido solidifica ou evapora, no estado sólido funde ou sublima e no estado gasoso ressublima ou condensa. 
O mesmo acontece no amor, esse narcótico da rotina. 

Pergunto-me se enquanto amamos somos estado líquido que aquece, arrefece e borbulha. Que transborda e entorna. Que molha e salpica quem nos rodeia. 
Pergunto-me se este mesmo amor solidifica em respeito, depois de um final infeliz, ou se se evapora em memórias depois de duas pessoas entrarem num estado de ebulição permanente.
Pergunto-me ainda se nos fundimos em dúvidas quando voltamos a cruzar o passado..

Pergunto-me tudo isto com uma única certeza. A certeza da implicação da mudança contínua dos estados para que todos possam coexistir:

Se o meu grande amor é a desilusão de alguém, a minha desilusão é o grande amor de outrem.



06 novembro, 2013

Bilhete de ida

Na vida, todos os caminhos têm saída. Poucos têm retorno.
Arrisco dizer: nenhum caminho tem retorno porque o tempo apaga o nosso o rasto.
Sabemos apenas que a origem é um lugar que nos parece sempre melhor do que aquele em que nos encontramos agora. Adjectivamo-lo de seguro e suspiramos: "quem me dera saber na altura o que sei hoje!"
Saber o que sabíamos hoje, tinha-nos deixado na casa de partida porque não há tabuleiro de jogo mais arriscado do que a vida e, tal como as cartas da sorte podem trazer jogadas de azar, também os grandes amores podem trazer os maiores desgostos.
Nesta rota colossal intitulada "destino", somam-se histórias materializadas em lugares que se dissipam em cada escolha, impedindo um bilhete de volta.

É por isso que a camisola se suja e fica suja.
É por isso que o comboio passa e é perdido.

É por isso que se ama e nunca se esquece quem se amou.


26 outubro, 2013

Sound: "the theatre of the mind"




Honda Civic "Choir" won a Gold Lion in the Cannes Lions Internacional Advertising Festival (June 2006).

15 outubro, 2013

Amanhã de ontem

A verdade não precisa de ser afirmada. Precisa apenas de ser consentida.
A verdade consente-se quando não é negada e, quando não se nega, nem mesmo a mentira pode corroer o que se quer não querer.

De que nos vale fugir de uma coisa quando nem a negamos? Se somos incapazes de negar, tão pouco ou menos somos capazes de fugir. 

Ainda que correndo para longe. 

24 setembro, 2013

A maturidade está na distinção

O maior erro do pensamento humano é submeter decisões a um quadro de prós e contras; uma listagem desleal em que o peso da ansiedade toma a forma de defeito ou expectativa. 
Na vida nada é a favor,  tão pouco contra. Tudo se trata de uma arrumação mental inconsciente entre o que queremos e o que precisamos e não há motivação que crie raízes nos dois lados. 
O que queremos ocupa grande parte de nós: uma dimensão pouco preenchida ainda que se estenda além dos limites. 
Acaba por nos preencher o que precisamos, ao anular espaços vazios deixados pelo querer, com a contrapartida de nunca sair fora dos traços do real. 
Difícil fica o rótulo: quero ou preciso? 
A diferença é tão grande que se torna imperceptível vista de dentro:

Precisar do que se quer acaba por nunca acontecer quando já se tem. Querer o que se precisa acaba por acontecer quando já se perdeu.



30 agosto, 2013

Até onde nos leva a música?

Não se mede em milhas ou quilómetros. Não tem ponto de partida nem de chegada. Assume um percurso entre o que mudou e o que nunca vai mudar e cria distância do hoje, mesmo que ouvida agora.
Leva-nos, ainda que dentro de nós, ao lugar onde a ouvimos pela primeira vez e ao tempo em que tentámos filtrar a nossa vida por aquele refrão.

Transporta-nos para outro tempo e para outra lugar. Para outro Verão e para outro amor. Por vezes, o primeiro.