06 novembro, 2013

Bilhete de ida

Na vida, todos os caminhos têm saída. Poucos têm retorno.
Arrisco dizer: nenhum caminho tem retorno porque o tempo apaga o nosso o rasto.
Sabemos apenas que a origem é um lugar que nos parece sempre melhor do que aquele em que nos encontramos agora. Adjectivamo-lo de seguro e suspiramos: "quem me dera saber na altura o que sei hoje!"
Saber o que sabíamos hoje, tinha-nos deixado na casa de partida porque não há tabuleiro de jogo mais arriscado do que a vida e, tal como as cartas da sorte podem trazer jogadas de azar, também os grandes amores podem trazer os maiores desgostos.
Nesta rota colossal intitulada "destino", somam-se histórias materializadas em lugares que se dissipam em cada escolha, impedindo um bilhete de volta.

É por isso que a camisola se suja e fica suja.
É por isso que o comboio passa e é perdido.

É por isso que se ama e nunca se esquece quem se amou.


26 outubro, 2013

Sound: "the theatre of the mind"




Honda Civic "Choir" won a Gold Lion in the Cannes Lions Internacional Advertising Festival (June 2006).

15 outubro, 2013

Amanhã de ontem

A verdade não precisa de ser afirmada. Precisa apenas de ser consentida.
A verdade consente-se quando não é negada e, quando não se nega, nem mesmo a mentira pode corroer o que se quer não querer.

De que nos vale fugir de uma coisa quando nem a negamos? Se somos incapazes de negar, tão pouco ou menos somos capazes de fugir. 

Ainda que correndo para longe. 

24 setembro, 2013

A maturidade está na distinção

O maior erro do pensamento humano é submeter decisões a um quadro de prós e contras; uma listagem desleal em que o peso da ansiedade toma a forma de defeito ou expectativa. 
Na vida nada é a favor,  tão pouco contra. Tudo se trata de uma arrumação mental inconsciente entre o que queremos e o que precisamos e não há motivação que crie raízes nos dois lados. 
O que queremos ocupa grande parte de nós: uma dimensão pouco preenchida ainda que se estenda além dos limites. 
Acaba por nos preencher o que precisamos, ao anular espaços vazios deixados pelo querer, com a contrapartida de nunca sair fora dos traços do real. 
Difícil fica o rótulo: quero ou preciso? 
A diferença é tão grande que se torna imperceptível vista de dentro:

Precisar do que se quer acaba por nunca acontecer quando já se tem. Querer o que se precisa acaba por acontecer quando já se perdeu.



30 agosto, 2013

Até onde nos leva a música?

Não se mede em milhas ou quilómetros. Não tem ponto de partida nem de chegada. Assume um percurso entre o que mudou e o que nunca vai mudar e cria distância do hoje, mesmo que ouvida agora.
Leva-nos, ainda que dentro de nós, ao lugar onde a ouvimos pela primeira vez e ao tempo em que tentámos filtrar a nossa vida por aquele refrão.

Transporta-nos para outro tempo e para outra lugar. Para outro Verão e para outro amor. Por vezes, o primeiro.







24 agosto, 2013

Rascunho de alguém

Não lhe pediu promessas. Muito menos lhe pediu que cumprisse as que fez e que riscou.
Não lhe pediu respostas nem sequer conversas sobre o que tinham sido. Mesmo ela quis esquecer que já tinham sido e só lhe pediu que, por uma noite, pudessem tentar perceber o que seriam isolando-se da sensatez. 
Não sabe a forma que deu às palavras nem como as moldou à aliciação. Sabe apenas que abandonou a ideia de um grande amor.
Fingiu perdoar toda aquela ausência e entregou o remorso à confiança. Uma confiança frágil, sustentada pelo que ainda conhecia dele e pela coragem que desconhecia ter.
Assim que o viu, quebrou a rigidez que jurou ao pecado manter, mas conseguiu permanecer do lado certo da barreira ténue que separava o constrangimento de uma atracção evidente. Esqueceu-se apenas de que a sedução é miscível assim que se depara com a combustão dos corpos.
Conduzia sem direcção definida. 
Só queria um sítio tão longe quanto o lugar onde em tempos se deixaram ficar e, esse lugar, não era, naquele Domingo frio de Janeiro, a cidade de Lisboa. Não era a agitação do Bairro Alto ou o barulho do Cais Sodré. Na verdade, esse lugar já não existia ou já não tinha caminho. "Vou levar-te a casa", disse ela. Mas ele não deixou. "Vamos para um lugar que eu conheço."
A rigidez de ambos desvaneceu num silêncio que invocava loucura e tensão. Sabiam apenas que a sua história era uma divisão que não tinha dado resto zero e a prova estava ali, num escuro quebrado apenas pela luz que iluminava aquele lago.
A noite ficava-lhes bem.
Irregulares e rebeldes, trocaram amor na sua forma mais pura à revelia de um passado que não o permitia. Sabiam que aquele era um agora sem tempo e exilaram-se na consciência um do outro. 
Ele esgotou-se e adormeceu. Ela lembrou-se do que tinham sido. Lembrou-se de respostas que nunca teve, de promessas que ele fez e que riscou. Agarrou-se de novo à ideia de um grande amor. Agarrou-se ao seu grande amor. Pediu muito que a manhã nunca chegasse e, numa lágrima contida, percebeu que a única forma de a manhã não chegar era não deixando que a noite passasse.
"onde é que vais?", perguntou ele. "Vou levar-te a casa". 
Os corpos arrefeceram e a realidade tocou-o. "Tchau", e com um beijo na cara saiu do carro daquilo que era, novamente para ele, uma estranha.

Afinal de contas, ela não lhe tinha pedido promessas.

22 agosto, 2013

Healthy blindness

As John Lennon said someday "living is easy with eyes closed".
So think: if the world was blind, how many people would you impress?